Tuesday, January 29, 2008

Prefácio de Ti

Quero-te e não te posso ter.
Tenho-te e não te posso querer.

E vou assim inconsciente sendo um,
Que consciente tenta ser um outro.
Presa e predador do meu desejo
de não te poder desejar.
Semente adulta nado-morta
ardendo em flor,
sem poder desabrochar.

E fecho os olhos para ver os teus,
que os meus abertos não conseguem ver.
Alvorada grandiosa que anoitece
Antes de ser.
Prefácio eterno de te querer,
Com que sacio a fome
De jamais te poder ter...



O Nostálgico

Friday, January 18, 2008

Perdoa-me


A tua sombra
Não estava onde eu a deixei.

Esperei,
Como era habitual,
Por ti,
A vida inteira...

Mesmo agora,
Já sem vida
que se veja,
Ainda espero...

...a tua sombra,
o teu perdão,
que sempre achei
que não perdia.


O Nostálgico

Tuesday, January 15, 2008

Deixem-me Dormir

Não existe nada
que me atormente tanto,
como sentir a chegada
da hora que me levanto.

Antes ficar enfiado,
dormente na minha cama.
Que assistir acordado
a mais um acto deste drama.

Fecho os olhos com firmeza.
Disso ainda sou capaz...
E peço ao relógio de mesa
Que funcione para trás.

Já disse que não me chamem!
Calem-me essa goela.
Hoje não me sinto bem...
E fechem essa janela.

A vida piora sem mim.
Não preciso de lá estar.
Quando chegar ao fim,
Venha alguém pra me acordar.



O Nostálgico

Leito de Mar


Velejei no marulhar dos teus cabelos.
Em marés que trazem ondas
que guardaste só pra mim,
Abandonei-me...

Naveguei pelos teus seios,
dedo após dedo,
lábio ante lábio, mergulhei
no teu fecundo e virgem mar de Primavera.

Oceanos de suor,
mistério nas nossas bocas salgado,
naufraguei,
na vertigem do momento
de seres minha.

Os nossos braços,
sargaços,
desenhavam corpos extenuados,
amantes desenfreados
nas profundezas de amar.

O meu olhar ofegante
ainda te viu azular
na crista do horizonte
enquanto despertava
neste leito de mar.


O Nostálgico

Monday, January 14, 2008

Penumbra

Aqui, penumbra!

Quedamo-nos incandescentes
e opacos
na disbulia citadina.

Adolescestes senis,
Observamos impotentes
as palavras que nos obrigam a dizer.

Cavernas...
Poços inteiros de silêncio dissimulado.
Paredes meias com o nada.
Teias onde aracnídeos nossos egos acasulam.

Quedamo-nos sim, joelhos juntos e incertos,
trémulos pelas ruas...
aos milhões,
percorremos sonâmbulos pelo céu recortado a urbe.

Em alvoroço,
passamos incessantes pelos dias.

Deixamo-nos,
calibrar
para não ver as nossas vidas.

Deixamo-nos,
Remexer corpo adentro por mãos sábias
e serenamente inúteis
baixamos as cabeças em uníssono.

Gavetas,
tão fechadas.

Milhões.
Sacudimo-nos inteiros
sob nuvens baixas,
ruminantes,
não querendo saber porque viemos.

Distâncias.
Carentes de tudo o que o que não nos falta.
Vazios.

Tivessemos nós a coragem...

Mas mergulhamos rostos na penumbra...



O Nostálgico

Friday, January 11, 2008

Eu Sou Tantos

Eu sou tantos...

Mares inteiros pedaços d’alma.
Céus imensos por saber.
Fico só, no meio de tantos ser...
Por todos ser não sou vivalma

Eu sou tantos...

Voos eternos, deixar-me ir...
Lugares cá dentro por mapear.
Nunca chego com desejo de ficar,
Nunca penso chegar a partir.

Eu sou tantos...

Espaços. Tempos. Navegantes
Que anseiam por naufrágio.
Universos reféns de seu adágio,
Libertados num destino de infantes.

Eu sou tantos...

Versos soltos, pensamentos.
Livros tão à espera de nascer.
Suas folhas, vagens, a escrever
As minhas vidas, meus momentos.

Eu sou tantos...

Infinitos rios a saltar margens
Improváveis fugitivos d’ Alcatraz
Só me deixo a mim pra trás,
Quando me torno em viagens.

Eu sou tantos!

Milhões e milhões de mim
Sou tão grande quantidade
Que quando busco a verdade
Do que sou, sou apenas um afim.

Eu sou tantos
Poemas que ainda não escrevi...



O Nostálgico

Procuro-te!

Procuro-te!

Desesperado,
ordenei uma rusga ao meu coração,
mas acabaram de me informar
que não te encontraram.

Amores cinzentos, turbulentos,
Cicatrizes, meretrizes
e paixões devassas, embora escassas
era tudo o que restava
neste salobro alçapão.

De ti nem um sinal, porque afinal
partiras, logo que conseguiras
uma artéria para longe da miséria
em que eu tinha transformado
a tua inocente paixão.

De ti, ainda assim, marcado em mim
ficou apenas o teu olhar, a sussurrar
a despedida, mão dorida
num aceno, amarga sentença
de infinita solidão.

Procuro-te!
Procuro-te até aos limites desta certeza de que não te vou encontrar.
Arrependido, dentro de mim tudo chora.
Alienado, fora de mim tudo é passado.


O Nostálgico