Wednesday, June 24, 2009

O meu beijo é o poema


Se eu pudesse tocar-te...
Se não houvesse distância...
E dos teus lábios retirar-te
Num enlevo, a fragância

De todas flores que quisermos
Semear pelos caminhos,
Dos nossos destinos ermos
Por onde vamos sózinhos.



Se distância não houvesse...
Ou se o mundo fosse em verso...
E tudo fosse o que parece,
Sem outro sentido inverso

Do sentido de quem ama,
Poderia enfim beijar-te.
Beijo ardente que reclama.
Se eu pudesse tocar-te...



Não poder estar a teu lado...
Distância nenhuma de mim...
Hemisfério separado
Deste amor que não tem fim,

Nem tem forma de amar.
Assim sofro a dor suprema,
Por não te poder tocar
E o meu beijo é o poema...



O Nostálgico

Thursday, May 14, 2009

Tempestade

E então a tempestade desabou
Sobre mim...

E o mundo, de repente,
Abateu-se num clamor
De chuva benevolente.

E o coração liquefeito,
Chorou as lágrimas todas
Que me doíam no peito.

E tudo o que eu não tinha,
Foi levado na enxurrada
Das ilusões que mantinha.

E a vida nasceu, radiante,
Da magnânima tormenta
De uma vida redundante.




O Nostálgico

Wednesday, May 6, 2009

Colibri


Escrevo na cadência sonolenta de uma infindável tarde.
Murmúrios de regatos que há em mim.
Pomo de pomares que descobri
Que em mim descobrem,
Com um espanto de jasmim,
O sentido incerto de ser Homem,
Nas asas de um colibri.



O Nostálgico

Sunday, November 2, 2008

Amar

Amar prejudica
gravemente
a sua saúde
e a dos
que o rodeiam



O Nostálgico

Friday, October 31, 2008

Peço-te que me doas


Podíamos tentar
a vida.
Desflorar de novo
a fulgurante madressilva.
Acreditar que somos
par,
que fomos
feitos para amar.


Esquecíamos que o silêncio
permanece.
afluente cansado
sem rio onde desaguar.
Sílabas oxidadas
na pele,
acorrentadas
em grilhetas de papel.


Apesar de tudo,
a vida
no tempo das palavras
e das lágrimas nos rostos,
tinha um fulgor
de vento,
um sabor
a ti no firmamento.


Apesar de tudo,
a dor
não nos doía.
Cristalina e certa,
vinha doce e sem
segredos,
numa vertigem
calma de arvoredos.


E agora se te olho
e não te vejo,
quero que me doa
a tua carne na minha.
Ter o teu corpo de novo
tacteado,
que já só provo
num perfume de passado.


Vamos tentar
de novo, a vida.
Mesmo que seja loucura!
Mesmo que seja com dor,
vivamos iludidos a sublime
imperfeição
que nos define...
Onde está a tua mão?


O Nostálgico

Tuesday, October 28, 2008

À espera de um poema


À espera de um poema...
Como quem espera por um comboio inesperado
Na estação do destino.
Que te leve para um lugar que só exista
Na poesia do partir.

À espera de um poema...
Deixa-te assim ficar, eterna e admirável passageira,
A perscutar a vida.
Que dissimula as palavras que antecipam
O poema que há na espera...


O Nostálgico

Um poema para ti II

Um poema para ti
Não carece de poesia.
A poesia vem de ti...
As palavras são as margens
E tu és a travessia.



O Nostálgico

Um poema para ti

Um poema para ti.
Pedaço de mim,
Em palavras.
Pedaço de mim,
Sublimado.
Para ficar noite inteira
Na mesa de cabeçeira,
Em versos, sonhando a teu lado.



O Nostálgico

Tuesday, October 14, 2008

Outono


Marés de folhas secas...
Vão e vêm, vão e vêm...
Com amarelado desdém.

Eu vou e venho com elas.
Folha seca ocasional,
Pardaçento e outonal...


O Nostálgico

Thursday, September 11, 2008

Vertiginosa Insanidade

Vertiginosa insanidade que há em mim...
Nada acontece fora de mim.
Tudo se passa dentro de mim.
E tudo é tanto, e tanto assim
em mim findando sem ter fim.

Por mais que queira, não consigo
querer dizer as coisas que não digo,
gritar os gritos que cá dentro grito.
E com a alma muda, a latejar, fatigo
este corpo estranho que vive comigo.

Rodopiando à minha volta, moribundo,
eu sou o círculo e sou eu que o circundo.
Vertiginosa insanidade onde são me afundo.
Não encontro o meu sentido neste mundo
e dele me afasto, ensandecido vagabundo...


O Nostálgico

Friday, September 5, 2008

Viagem

Quem me dera ver o mundo que há para ver,
Desta varanda sobre a minha rua sem saída.
Perímetro exterior da minha alma corroída,
Onde minha vida se vai deixando entorpecer.

Queria ser aquele ponto luzidio que cintilante
Desafia a noite, o breu do mundo com ousadia.
Que torna a tempestade que em mim ruge em calmaria
E me transporta numa ida eterna e delirante.

Por entre rudes vagas vejo o horizonte obscuro.
De inseguras amuradas vejo negras naus, navios errantes,
Que rumam indiferentes para portos tão distantes,
E para longe e tarde levam meu senil futuro.


O Nostálgico

Tuesday, August 12, 2008

A vida é bela

Quem disse que a vida é bela,
Não viveu decerto a mesma
Vida que me flagela.

Devo ter entrado nela
Não pela estrada dourada,
Mas por bastarda viela.

A vossa, perfeita aguarela.
Ostensiva felicidade
Servida em nobre baixela.

Pois eu tenho que sofrê-la.
Severa realidade
No fundo de uma tigela.

Minha vida é paralela.
Do lado oposto, encurralado
Chão dorido desta cela.

Tudo fiz p'ra merecê-la
Mas tudo não foi bastante
E não tive lugar nela.

E assim se vai urdindo a tela,
Que esta vida sem sentido
Com tristeza em mim pincela.

Dir-vos-ei que a vida é bela
No ansiado momento
Em que estiver a perdê-la.



O Nostálgico

Wednesday, April 2, 2008

Algures num banco de jardim

O mundo inteiro cabia no teu sorriso
Quando entraste no meu dia sem aviso.
No teu olhar a ver a vida a vaguear,
Perdi-me na criança que outrora
Vagueou irrequieta dentro de mim.

Em compassadas e longínquas primaveras
Cansei as tardes em demanda de quimeras,
Sem outro sentido que o de serem só minhas,
Por onde deambulas tu agora
E nelas corres pelas tardes agora tuas.

Com as tuas mãos que colhem brisas ancestrais
E arriscam fisgas aos pardais,
Esculpo a pedra tosca da memória
E a minha face de menino,
Deslumbra-se de novo com a vida.

Transbordantes pelas margens, as nascentes
De ribeiros de sonhos sem poentes,
Impediam que o futuro alguma vez acontecesse.
Que afinal tu me trazes sem querer
E sem saber, que já não sonho.

E o meu corpo tão curvado pela alma pesarosa
Que na poesia já só consegue ver prosa,
Enlevado nos teus risos sem lembrança,
Salta muros e veredas, e recorda
Tudo quanto já não pode vir a ser.




O Nostálgico

Wednesday, March 26, 2008

Possa eu amar-te para sempre...

Possa eu amar-te para sempre...

Diluir-me em ti suavemente
Como névoa na neblina.
Minha alma clandestina,
Aninhada em ti eternamente.

Confundir o teu destino com o meu.
Perpétuo eco dos teus passos,
Fracasso dos teus fracassos
E nas vitórias teu Orpheu.

Se para sempre seja pouco,
Possa amar-te mais ainda...
Que a tua beleza não finda
E o meu amor tão-pouco.



O Nostálgico

Thursday, February 7, 2008

Sentidos Figurados

Figuras aparentes
do que esperam
que eu seja.

Palavras decalcadas
do que querem
que eu diga.

Ideias copiadas
do que pensam
que eu penso.

Pantominas ocas
do que exigem
de mim.

Sentidos figurados.
Por instinto...
Em que minto
tanto e tanto,
até que garanto
que os sinto.



O Nostálgico

Friday, February 1, 2008

J

O teu abismo particular.

A noite onde uma noite todas as noites vão acabar.

A dor sem dor depois de te doer a saltar.


E eu aqui suspenso...



O Nostálgico

Tuesday, January 29, 2008

Prefácio de Ti

Quero-te e não te posso ter.
Tenho-te e não te posso querer.

E vou assim inconsciente sendo um,
Que consciente tenta ser um outro.
Presa e predador do meu desejo
de não te poder desejar.
Semente adulta nado-morta
ardendo em flor,
sem poder desabrochar.

E fecho os olhos para ver os teus,
que os meus abertos não conseguem ver.
Alvorada grandiosa que anoitece
Antes de ser.
Prefácio eterno de te querer,
Com que sacio a fome
De jamais te poder ter...



O Nostálgico

Friday, January 18, 2008

Perdoa-me


A tua sombra
Não estava onde eu a deixei.

Esperei,
Como era habitual,
Por ti,
A vida inteira...

Mesmo agora,
Já sem vida
que se veja,
Ainda espero...

...a tua sombra,
o teu perdão,
que sempre achei
que não perdia.


O Nostálgico

Tuesday, January 15, 2008

Deixem-me Dormir

Não existe nada
que me atormente tanto,
como sentir a chegada
da hora que me levanto.

Antes ficar enfiado,
dormente na minha cama.
Que assistir acordado
a mais um acto deste drama.

Fecho os olhos com firmeza.
Disso ainda sou capaz...
E peço ao relógio de mesa
Que funcione para trás.

Já disse que não me chamem!
Calem-me essa goela.
Hoje não me sinto bem...
E fechem essa janela.

A vida piora sem mim.
Não preciso de lá estar.
Quando chegar ao fim,
Venha alguém pra me acordar.



O Nostálgico

Leito de Mar


Velejei no marulhar dos teus cabelos.
Em marés que trazem ondas
que guardaste só pra mim,
Abandonei-me...

Naveguei pelos teus seios,
dedo após dedo,
lábio ante lábio, mergulhei
no teu fecundo e virgem mar de Primavera.

Oceanos de suor,
mistério nas nossas bocas salgado,
naufraguei,
na vertigem do momento
de seres minha.

Os nossos braços,
sargaços,
desenhavam corpos extenuados,
amantes desenfreados
nas profundezas de amar.

O meu olhar ofegante
ainda te viu azular
na crista do horizonte
enquanto despertava
neste leito de mar.


O Nostálgico

Monday, January 14, 2008

Penumbra

Aqui, penumbra!

Quedamo-nos incandescentes
e opacos
na disbulia citadina.

Adolescestes senis,
Observamos impotentes
as palavras que nos obrigam a dizer.

Cavernas...
Poços inteiros de silêncio dissimulado.
Paredes meias com o nada.
Teias onde aracnídeos nossos egos acasulam.

Quedamo-nos sim, joelhos juntos e incertos,
trémulos pelas ruas...
aos milhões,
percorremos sonâmbulos pelo céu recortado a urbe.

Em alvoroço,
passamos incessantes pelos dias.

Deixamo-nos,
calibrar
para não ver as nossas vidas.

Deixamo-nos,
Remexer corpo adentro por mãos sábias
e serenamente inúteis
baixamos as cabeças em uníssono.

Gavetas,
tão fechadas.

Milhões.
Sacudimo-nos inteiros
sob nuvens baixas,
ruminantes,
não querendo saber porque viemos.

Distâncias.
Carentes de tudo o que o que não nos falta.
Vazios.

Tivessemos nós a coragem...

Mas mergulhamos rostos na penumbra...



O Nostálgico

Friday, January 11, 2008

Eu Sou Tantos

Eu sou tantos...

Mares inteiros pedaços d’alma.
Céus imensos por saber.
Fico só, no meio de tantos ser...
Por todos ser não sou vivalma

Eu sou tantos...

Voos eternos, deixar-me ir...
Lugares cá dentro por mapear.
Nunca chego com desejo de ficar,
Nunca penso chegar a partir.

Eu sou tantos...

Espaços. Tempos. Navegantes
Que anseiam por naufrágio.
Universos reféns de seu adágio,
Libertados num destino de infantes.

Eu sou tantos...

Versos soltos, pensamentos.
Livros tão à espera de nascer.
Suas folhas, vagens, a escrever
As minhas vidas, meus momentos.

Eu sou tantos...

Infinitos rios a saltar margens
Improváveis fugitivos d’ Alcatraz
Só me deixo a mim pra trás,
Quando me torno em viagens.

Eu sou tantos!

Milhões e milhões de mim
Sou tão grande quantidade
Que quando busco a verdade
Do que sou, sou apenas um afim.

Eu sou tantos
Poemas que ainda não escrevi...



O Nostálgico

Procuro-te!

Procuro-te!

Desesperado,
ordenei uma rusga ao meu coração,
mas acabaram de me informar
que não te encontraram.

Amores cinzentos, turbulentos,
Cicatrizes, meretrizes
e paixões devassas, embora escassas
era tudo o que restava
neste salobro alçapão.

De ti nem um sinal, porque afinal
partiras, logo que conseguiras
uma artéria para longe da miséria
em que eu tinha transformado
a tua inocente paixão.

De ti, ainda assim, marcado em mim
ficou apenas o teu olhar, a sussurrar
a despedida, mão dorida
num aceno, amarga sentença
de infinita solidão.

Procuro-te!
Procuro-te até aos limites desta certeza de que não te vou encontrar.
Arrependido, dentro de mim tudo chora.
Alienado, fora de mim tudo é passado.


O Nostálgico

Tuesday, December 11, 2007

Amor


Sofre!

Arruina a tua existência.

Entrega-te de corpo e alma
à sofreguidão do amor...


O Nostálgico

Caçatempo

Lá vou eu!
Aberto e pleno,
plano por entresobre imagens.

Subitariamente, encalho.
Espalho... um grito lento,
seco e sacro.
E lacro as portas do universo.

Agora que fechado o espaço,
laço o tempo, contratempo,
encaixo a besta, contrabaixo
e rumo ao mundo, me relaxo.

Acorrento o animal,
intemporal, omnipresente.
Eternamente enjaulado
numa fracção de presente.

O Nostálgico
(Nostalgia de 1985)

Monday, December 10, 2007

Falésias

Construo falésias de onde possa ver o mar...
Penhascos feitos de imaginação.
Imponentes guardiões
Do meu pensamento alado.

Sobrevoo a vastidão da minha ausência
E compreendo enfim a tua,
Quando volto com as mãos cheias de vento
E o corpo tão cansado.

A soletrar silêncios permaneço eterno,
Porém fugaz se não te souber aqui.
Construo falésias de onde possa ver o mar,
De coração destroçado.



O Nostálgico

Thursday, December 6, 2007

Nostálgico #1

"De tudo ficaram três coisas:

A certeza de que estamos sempre começando...
A certeza de que é preciso continuar...
A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...

..."

Fernando Sabino



Simples, belo (como todas as coisas simples) e suficientemente "nostálgico" para constar aqui.

O Nostálgico

Não suporto a poesia

Não suporto a poesia.
Deles...



Irrita-me a sua maneira,
Sobranceira
De rimar.

Enfastiam-me os seus versos
Controversos
A chiar.

Cheios de salamaqueques,
Como Queques
A snobar (... sim, sei que a palavra não existe.
Mas perdoem este chiste,
sabem onde quero chegar.)

Seu narciso ego que fala,
Alcavala.
A monologar.



Não recuso a poetanásia.
Deles...

O Nostálgico

Tuesday, December 4, 2007

Fim de tarde, fim de dia


Fim de tarde, fim de dia.
Escassa a luz e o meu corpo,
Todo ele é pensamento
ansioso, vago e lento,
Em tormentosa melodia.

Sombreados já os espaços,
Escureçe a minha alma
sobre os campos, na agonia.
Fim de tarde, fim de dia
Do afastar dos teus passos.

Impotentes, os meus olhos
aguam-se em sofrimento.
Querer-te em silêncio é vão
Mas calar meu coração
É perder-te nos meus sonhos.

Rarefaz-se o sol poente
Que foi ver-te p'la janela.
Por momentos foste minha
E amanhã pela tardinha,
Serás minha novamente.

O Nostálgico

Prisioneiro

Sou eternamente teu, carcereira!

Prisioneiro exangue dos teus lábios,
esfomeado...
Agrilhetado nos teus beijos.

Condenado a prisão perpétua
pelo tribunal do teu regaço,
quando nele um dia
descansei o pensamento.

Não desejo a liberdade...



O Nostálgico